A Coleção

Dos seus 63 anos de vida, Ferdinand Willi Flick (1934-1997) dedicou 52 a um grande amor: o cinema. Willi, como a família o chamava, era um menino de nove ou dez anos quando, na década de 1940, encontrou-se com a sétima arte, levado pelo pai a uma sessão numa sala de cinema da pequena cidade de Vitória da Conquista, no interior da Bahia. Tornou-se frequentador das matinês e amigo de um funcionário da sala de projeção, que lhe dava pedacinhos das películas de filmes, guardadas por ele em caixinhas de fósforo, começando ali, mais precisamente em 5 de março de 1945, a “Filmoteca Preciosa”, depois chamada de “Coleção Preciosa”. 

Mais tarde, trabalhou como projecionista em duas salas de cinema na cidade, o Riviera e o Eldorado, o que facilitava a aquisição dos fotogramas, que já eram então guardados em caixas de sapato e, depois, em caixas maiores, até passarem a compor álbuns, em 1950. Eram, para ele, a maior preciosidade da coleção, mas não a única. De técnico de projeção passou a técnico de refrigeração, mas continuou a juntar tudo o que podia: além dos raros recortes de películas de projeção (chamadas por ele de filmogramas), cartazes, pôsteres, folhetos antigos dos cinemas de Vitória da Conquista, recortes de jornais, revistas e outros muitos itens que contam parte da história do cinema mundial e nacional e também das salas de cinema na terceira maior cidade da Bahia. 

Entre os materiais que viriam a compor a coleção, boa parte era daqueles que seriam descartados pelas salas de cinema, os que ele recebia de amigos e clientes e aqueles que recebia por correspondência, enviados por outros colecionadores de várias partes do Brasil, com quem trocava cartas e diversos itens, a partir de anúncios publicados em revistas, em que os anunciantes informavam seus interesses de trocas (itens a serem enviados e recebidos) e seus endereços.     

Seu Flick, como era chamado pelos clientes, dedicava-se à coleção e a guardava em sua  pequena oficina de eletrodomésticos, na Rua 2 de Julho, a mesma da casa em que nasceu Glauber Rocha, no Centro da cidade. Faleceu em 1997, sem ver concretizado o seu sonho de mostrar numa exposição todo o material colecionado. A família recebeu propostas de colecionadores, que se interessaram em adquirir partes da coleção, mas preferiu mantê-la, com vistas a uma futura disponibilização à comunidade, para fins de conhecimento e pesquisa. 

Com o falecimento, em 2004, da esposa do colecionador, Dona Leda Flick, a coleção foi transferida da casa da família para guarda na sede do Museu Pedagógico – Casa Padre Palmeira, vinculado à Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), localizada na Praça Sá Barreto, na região central de Vitória da Conquista, e, depois, no Centro de Documentação Albertina Vasconcelos, também vinculado ao Museu Pedagógico e situado no campus da Uesb. Partes da coleção já integraram exposições temáticas abertas ao público, mas ela não havia sido catalogada em sua integralidade até a realização do projeto, que inclui a exposição virtual a que este site se destina. 

Tal projeto, intitulado “Acervo Willi Flick – Catalogação, digitalização e exposição on-line”, foi aprovado no Prêmio das Artes Jorge Portugal/Programa Aldir Blanc Bahia, em 2020, com o objetivo de contribuir com a preservação da coleção de itens de cinema de Ferdinand Willi Flick e disponibilizar todo o material possível de ser exposto para consulta por estudiosos, cinéfilos, realizadores audiovisuais, colecionadores e qualquer cidadão, grupo ou instituição que se interesse pelo valoroso conjunto de materiais.